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Processos de violação de copyright nos EUA: A insuficiência da utilização do IP como prova de autoria.

O judiciário americano passa por uma discussão interessante, sobre a capacidade do software de rastreamento de localização geográfica identificar o acusado por violação de Propriedade Intelectual na internet.

 

Vitor A. Wagner Kist

 

O judiciário americano passa por uma discussão interessante, sobre a capacidade do software de rastreamento de localização geográfica identificar o acusado por violação de Propriedade Intelectual na internet.

É comum que as empresas detentoras de direitos de propriedade intelectual de filmes, músicas, e demais produtos facilmente disponibilizados por usuários na rede, possuam um programa chamado de Geolocation IP Software, que possibilita rastrear o IP[1] dos usuários que estão fazendo download ilegal de suas obras.

Em posse dessas informações, os escritórios de advocacia que representam as empresas detentoras de direitos de propriedade intelectual processam, todos os anos, civil e criminalmente milhares de usuários em todo o mundo. São os chamados “copyright trolls”.

Copyright Troll é um termo pejorativo para empresas que, visando a obtenção de recursos financeiros, ajuízam de forma agressiva e oportunista ações em massa contra os usuários que fazem o download de conteúdo protegido e pertencente a eles,obrigando-os a aceitarem acordos vultuosos, muito superiores ao preço de venda do produto.

Geralmente estas empresas sequer licenciamseus produtos para distribuição, utilizando os direitos de propriedade intelectual de uma forma distorcida, o que, ao invés de fomentar a criação artística e de conhecimento, acaba dificultando a sua circulação.

O estado da arte nas cortes norte americanas.

Algumas decisões recentes dos tribunais americanos sobre deste tipo de prática pode fazer com que seus dias estejam contados.

Ajuíza federal UrsulaUngaro, responsável pelo caso Malibu Media v. Fulano da Silva[2], em que se discutiam infrações de direitos de copyright no download de obras pornográficas supostamente efetuadas por um usuário específico, requereu ao Autor queexplicasse o por que o juízo deveria presumir a autoria da infração simplesmente pela comprovação de que ela fora cometida na residência do Réu.

Segundo a juíza, “mesmo que o endereço de IP fosse compatível com o endereço do Réu, o software de localização não pode identificar quem tem acesso ao computador dessa residência e quem poderia estar usando-o para infringir os direitos de copyright do requerente.”[3]

Dessa forma, a corte americana entendeu que o endereço de IP não é informação suficiente para identificar o usuário que cometeu a infração.

Em uma analogia simples, se alguém faz uma ligação telefônica ameaçando outra, não há prova de que o titular da linha é o autor da ameaça simplesmente por ser responsável pelo contrato telefônico.[4]

Em resumo, um endereço de IP não é uma pessoa, e comprovar que o download foi feito em determinado endereço de IP não comprova que o foi o usuário quem cometeu a infração.

Esse entendimento está sendo adotado repetidamente nas cortes da Flórida[5] e vem ganhando força no judiciário americano, fazendo com que inúmeros casos de massa que tratam de infração a direitos de copyright sejam extintos sem análise do mérito.

Essa guinada das cortes americanas, se vier a se tornar uma corrente majoritária, vai dificultar muito a atuação dos escritórios que atuam em prol das empresas detentoras de copyright, praticamente impossibilitando-os de promover ações contra os usuários, visto a extrema dificuldade de comprovação de qual indivíduo realmente efetuou o download.

 

A utilização de IP como prova no Brasil

A Jurisprudência de utilização de IP para a comprovação de autoria de ilícitos na rede é bastante reduzida no Brasil, pois, como por aqui não temos a cultura de demandas em massa e genéricas nas ações que envolvem a internet, geralmente o endereço de IP vem acompanhado de demais provas que reforçam os argumentos da parte.

Porque o judiciário brasileiro não enfrenta esses problemas cotidianamente, o debate jurídico na área é bastante raso, acompanhando as decisões do judiciário, que não firmou seu entendimento sobre o tema.

O Desembargador Ludwig, da 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, manteve a condenação dada em primeira instância de um homem a indenizar os danos morais causados em razão do envio de mensagens eletrônicas originadas de seu computador.[6]

Afirmou o julgador que o proprietário do computador, titular da assinatura de internet, é responsável pelo conteúdo das mensagens eletrônicas originadas a partir do seu endereço IP.

Afirmou ainda que era dever do proprietário do computador zelar pelo seu uso, visto que esta instalado em sua residência e registrado em seu nome.Reconhecendo sua responsabilidade em face da culpa in vigilando, porquanto essa decorre da falta de atenção ou cuidado com o procedimento de outrem.

Esse entendimento segue a linha de raciocínio tal qual se faz com relação à responsabilidade do proprietário do veículo automotor.Contudo não se pode comparar a periculosidade e responsabilidade gerada por um veículo automotor a de um computador.

Tal analogia é falha no sentido de que o automóvel representa um risco claro, e uma capacidade de causar danos a outrem muito superior ao de um computador, basta perceber que existe uma idade mínima e um curso extenuante para a utilização de um carro, enquanto crianças ganham Tabletse aparelhos celulares, computadores em latu sensu, com poucos anos de idade.

Na mesma linha de entendimento, o Desembargador Francisco Luiz Macedo Júnior, afirmou, ao julgar caso análogo[7], que os dados relativos aos números de IP do computador de onde foram originadas as informações ofensivas são suficientes para identificar cada usuário que utiliza a internet. E, nas palavras do julgador “tais dados bastam, para identificar os usuários responsáveis pelas informações alegadamente ofensivas, constantes nas postagens combatidas pelo demandante.”

Analisando a escassa jurisprudência nacional sobre o assunto, pode-se concluir que o entendimento do judiciário brasileiro segue a linha majoritária das cortes norte americanas, isto é, o titular da assinatura da internet é responsabilizado pela prática ilícita originada de seu endereço de IP.

Tal entendimento é falho no sentido de que o Internet Protocol, não se refere a uma pessoa, e sim a uma assinatura de Internet, sendo impossível constatar quem tem acesso ao computador cadastrado e, por conseguinte, quem é o autor da violação.

 

 

 

 

 


[1]IP é a abreviação de Internet Protocol, isto é, o endereço eletrônico do computador na Internet.

[2]O termo utilizado no inglês para partes desconhecidas ou irrelevantes em disputas judiciais é John Doe, e foi livremente traduzido como Fulano da Silva para facilitar o entendimento do texto.

[3]Case 1:14-cv-20213-UU Document 10 Entered on FLSD Docket 03/20/2014. Disponível em: http://fightcopyrighttrolls.com/2014/03/22/florida-judge-dismisses-a-malibu-case-because-lipscomb-failed-to-establish-a-connection-between-an-ip-address-and-person/ Acessado em 29 de abril de 2015.

[6]Apelação 70025756222 – TJRS – 6ª Câmara Cível, Relator Artur Arnildo Ludwig.

[7]Agravo de Instrumento nº 912187-1 do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná