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O caráter jurídico dos contratos de transferência de tecnologia e o seu papel na economia contemporânea

Bibiana Biscaia Virtuoso • Fidel Klipstein

Desde o século XX, verifica-se um forte crescimento e propagação do sistema capitalista na sociedade atual, com este se tornando cada vez mais complexo e especializado. Essa maturação foi acompanhada de um intenso desenvolvimento econômico e tecnológico nos países de primeiro mundo, os quais viram a necessidade de adaptar cada vez mais suas relações comerciais com as outras nações ainda em desenvolvimento, estas, desejando a possibilidade de evoluir internamente, sendo o Brasil um país que não se ausentou deste processo.

Atualmente, essas novas formas de ações e relações econômicas (seja entre países ou entre empresas internas de uma mesma ou diferente nacionalidade), quedependem de um alto grau de recursos técnicos e tecnológicos para se estruturarem e que se mantém em formas de trocas comerciais de tecnologia, abriram espaço para a criação dos contratos de transferência de tecnologia na área jurídica. Destaca-se sua importância para a economia brasileira e suas características perante o direito no âmbito nacional.

1. O QUE É UM CTT E EM QUE TIPOS ELE SE APRESENTA

O contrato de transferência de tecnologia (CTT) é um conjunto de cláusulas estabelecidas entre dois grupos, que tem por objetivo a transferência de um determinado conhecimento técnico, de uma parte para a outra (o cedente e o cessionário). Seu fundamento se dá no fato de um grupo (geralmente uma empresa) possuir um interesse econômico no objeto tecnológico que o outro grupo (geralmente um ou vários pesquisadores, apoiados por uma universidade) criou e aperfeiçoou, pelo fato deste objeto ser um diferencial no âmbito corporativo. Isto torna a transferência de tecnologia (TT) uma maneira de acirrar a concorrência de mercado. Constitui-se em uma troca de compra e venda, em que a empresa adquire, através do CTT, o direito de usufruir da produção e comercialização dessa tecnologia no mercado. Outro caráter importante dessa espécie de contrato, é a de que sua legitimação deve ser feita pelo Estado. No caso do Brasil, é feito pelo INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial), órgão vinculado ao Ministério da Indústria e do Comércio.

Há variados tipos de CTTs no âmbito jurídico e econômico, todos celebrados com o objetivo de oferecer um destaque para a empresa, o que a torna capaz de competir com as outras de mesmo ramo.

  • Patentes: o direito, concedido pelo INPI, do cessionário utilizar a tecnologia ofertada pelo cedente para atingir os fins de sua empresa.
  • Contratos de know-how: se apresentam como a transferência de um determinado conhecimento em como efetivar determinada ação. Vale ressaltar que a empresa, ao receber esse conhecimento, não se torna capaz de “devolve-lo” ao cedente após o término de vigência do contrato.
  • Serviços de Assistência Técnica e Científica: são as prestações de serviços realizados, sejam de programação ou ajuda técnica, de quem detêm a propriedade industrial, para o contratante deste determinado serviço.

2. FUNCIONAMENTO NO CENÁRIO ECONÔMICO ATUAL

Frisa-se que uma das principais razões de existência dos CTTs se dá pela sua função no desenvolvimento econômico e comercial do mundo: os países ou empresas que adquirem uma tecnologia nova possuem a oportunidade de aplica-la da maneira que melhor lhe convém para trazer vantagens, seja no âmbito público nacional trazendo melhorias para a sociedade em geral, seja no âmbito privado para constituir um mercado concorrido com cada vez mais inovações.

No âmbito público nacional, um país deve adquirir e aplicar uma técnica nova para melhorar a vida de sua população, assim como deve absorver o máximo de conhecimento novo sobre aquele objeto que está em sua posse, para que assim a nação continue evoluindo no cenário capitalista atual.

No âmbito privado, uma empresa, ao obter o direito de usar qualquer elemento de propriedade industrial, deve usufruir desta para incentivar cada vez mais novidades e destaques na lógica de mercado. Isto, além de trazer lucros para a empresa, fomenta cada vez mais a ideia de livre concorrência e de uma competitividade no mundo corporativo.

3. A REGULAMENTAÇÃO DOS CTTS

A regulamentação dos CTTS é dada pelas diversas normas sancionadas pelo Estado brasileiro, sendo as principais:

  • Lei nº 9.279/96: regula os direitos e deveres da Propriedade Intelectual.
  • Lei nº 9.610/98: trata sobre os Direitos Autorais.
  • Lei nº 5.648/70: regulamentação do INPI.
  • Portaria nº 11, de 27 de janeiro de 2017: sobre o Regimento Interno do Instituto Nacional da Propriedade Industrial.

4. O CONTRATO

É essencial que na celebração do contrato haja boa-fé, pois este é o princípio que fará com que os objetivos de ambas as partes sejam atingidos, em que estas sejam capazes de observar o benefício que esse CTT trará para o futuro, tanto para o lucro e competividade da empresa, quanto para a fomentação de Pesquisa e Desenvolvimento por parte do proprietário industrial.

O esclarecimento das cláusulas que forem determinados é também algo de notável percepção, já que a clareza é o que determinará que não ocorram litígios durante a vigência desse acordo.

5. DEMONSTRAÇÃO DE UM CASO PRÁTICO DE UM CTT NO BRASIL

Em junho de 2017, houve um acordo entre a Visiona Tecnologia Espacial (uma joint-venture da Telebrás e Embraer), a Agência Espacial Brasileira (AEB), e a Tales Alenia Space (TAS, uma fabricante aeroespacial franco-italiana), o qual visava a transferência tecnológica de um satélite geoestacionário dessa fábrica europeia para o Brasil. O objetivo era aprimorar a vigilância militar no país em áreas de difícil observação e análise, efetivar uma produção de conhecimento mais elevado no Brasil, no que diz respeito ao âmbito espacial (a criação de um bloco espacial no ITA, exemplo), assim como melhorar a transferência de dados e banda larga pelo território nacional, conectando até mesmo as regiões mais remotas.

Nesse acordo trilateral, a AEB ficou responsável por toda a fiscalização do contrato, seguindo rigidamente as normas estabelecidas em relação aos acordos de propriedade industrial, também impondo estas às ações da TAS. Felizmente, o contrato foi celebrado de maneira efetiva, garantindo a interiorização de uma nova tecnologia que beneficiou o país.

6. CONCLUSÃO

Percebe-se que há um intenso universo de estruturas jurídicas e econômicas que compõe o mundo dos contratos de transferência de tecnologia, onde estes podem servir tanto para o bem, ao pavimentar o desenvolvimento econômico e social de determinado país ou bloco empresarial, como para o mal, ao causar a dependência dos países não-desenvolvidos para com os contratos de transferência, já que estes acabam por somente importar o novo em vez de tentar produzir o novo, em uma espécie de colonialismo tecnológico.

Portanto, se torna perceptível a necessidade de um conhecimento básico perante essa forma de relação econômica-jurídica presente nos CTTs, a qual se apresenta como recorrente na sociedade moderna capitalista, sendo hoje parte da estrutura fundamental que a compõe.

REFERÊNCIAS

AXELROD, Robert. A evolução da cooperação. Tradução de Jusella Santos. São Paulo: Leopardo, 2010.

BHERING, Philippe. Aspectos Legais – Transferências de Tecnologia. Disponível em: www.ahkbrasilien.com.br/BheringAdvogados

BONILHA, C. Visiona tecnologia espacial integrará satélite da Telebras. Mundo Digital, [S.l.]: nov. 2013. Entrevista concedida a Ethevaldo Siqueira. Disponível em: <http://www.telequest.com.br/portal/index.php/noticias/telecomunicacoes/904- visiona-tecnologia-espacial-integrara-satelite-da-telebras> Acesso em 01 jun. 2018.

PEREIRA RIBEIRO, Marcia Carla. Da Rocha Jr, Weimar Freire. Czelusniak, Vivian Amaro. Mecanismos jurídicos e econômicos para a transferência de tecnologia: um estudo de caso. Revista Direito GV, 2017.

REZENDE, Agatha S. Transferência de Tecnologia e o Desenvolvimento Econômico: uma analise jurídica no âmbito da construção do Satélite Geoestacionário Brasileiro. Disponível em: https://portalintelectual.com.br/portal/transferencia-de-tecnologia-e-o-desenvolvimento-economico-uma-analise-juridica-no-ambito-da-construcao-do-satelite-geoestacionario-brasileiro-2/