Sport condenado a indenizar cartunista por uso de leão estilizado em camisa de jogo

João Pedro Canassa Montanher[1]

Rodrigo Glasmeyer[2]

Os clubes de futebol são os exclusivos proprietários dos símbolos que os representam. Apesar disso, a disposição, aparentemente clara, do artigo 87[3] da lei Pelé (lei 9.615/1998) apresenta uma área cinzenta considerável.

É costume do jornalismo esportivo a produção de charges, caricaturas e outras representações dos clubes, através de seus mascotes, jogadores e símbolos, retratando resultados e eventos relevantes. Chico Caruso, Angeli, Mario Alberto, entre outros, tem posição cativa na imprensa, seja nos meios eletrônicos ou físicos.

1. O RESP 1.342.266/PE

Em que pese a prática amplamente difundida e de origem quase contemporânea à própria análise jornalística do esporte, a decisão da quarta turma do STJ no REsp 1.342.266/PE, datada 07 de março do presente ano, que sustenta que os símbolos desportivos não se estendem às charges e animações que diferem da oficial, encontrou entendimento divergente entre os próprios ministros do órgão colegiado.

Os fatos que motivaram a análise pelo judiciário se referem a reprodução parcial da charge de um leão, símbolo representativo e mascote do Sport Clube Recife, em camisas oficiais do time de futebol, utilizada nos anos 2002/2003, sem a autorização do autor da charge, o Sr. Miguel Abreu Falcão. A ação foi proposta pelo cartunista contra o clube, sua fornecedora de material esportivo São Paulo Alpargatas S.A (à época, detentora da propriedade industrial da marca Topper) e lojas que comercializavam a camisa do clube, contudo, o juízo de piso remeteu a ilegitimidade passiva destas.

Miguel Abreu Falcão é cartunista do Jornal do Commércio de Recife/PE, meio de comunicação pelo qual foi veiculada a charge do leão, assim como no site www.futbrasil.com (supostamente, o contratante original da produção artística).

O requerimento inicial do autor foi a indenização em face do benefício econômico auferido pelo comércio das camisas de futebol com a charge, sem a respectiva contraprestação por partes dos beneficiários (que não detinham autorização autoral para quaisquer atos), e a indenização decorrente de direitos extrapatrimoniais (morais), em face da ausência de reconhecimento de paternidade e vinculação do nome do autor no desenho incluído na peça de vestuário. Encontrando fundamentação nos dispositivos do artigo 24, incisos I e II[4] e artigo 29, inciso I[5] da lei de direitos autorais (lei 9.610/98). Contudo, a petição originária foi julgada improcedente pelo juízo de 1º grau.

Interposto recurso de apelação, o TJPE reformou a sentença de mérito prolatada pelo juiz singular, dando procedência as indenizações pugnadas, entendendo que:

i. as charges, caricaturas e animações são obras de atividade intelectual de seu autor, criando obra nova e original;

ii. decisão no sentido contrário decorreria em ausência de proteção a categoria profissional dos cartunistas;

iii. a autorização do proprietário dos símbolos da entidade desportiva é prescindivel para a transformação destes, pois seria situação analógica à dispensa de autorização expressa para a utilização da imagem de “pessoas públicas”, inclusive em charges e representações.

O clube de futebol, irresignado com a decisão do Tribunal Estadual, interpôs o referido Recurso Especial, reiterando a violação aos art. 87 da lei 9.615/98 e art. 33 da lei autoral[6].

2. O DIREITO AUTORAL DA CHARGE

O acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça manteve a procedência do pedido do cartunista Miguel Falcão, ou seja, concluiu-se pela responsabilização do Sport por não observar os direitos do autor da charge, motivando condenação indenizatória. Por outro lado, o escopo de interpretações que surgiram da discussão deste julgamento é de onde se extrai a riqueza das possibilidades e contraposições das normas pertinentes ao caso concreto.

De um lado estaria o questionamento se a proteção da propriedade exclusiva dos clubes deveria ser interpretada de maneira extensiva, uma vez que a redação da lei define que pertencem ao rol de bens do clube sua “denominação, símbolos, nomes e apelidos”. Apenas desta afirmação, surge espaço para ampla discussão, e casos como este exigem uma definição mais clara de até qual ponto o clube pode ter o direito à imagens e vocabulários de utilização ampla e corriqueira, inclusive pela imprensa.

Um excesso dessa propriedade seria, por exemplo, considerar, que toda a utilização de gravura de um leão se trataria da propriedade exclusiva de algum clube ou, ao contrário, de que o clube tenha o direito de utilizar livremente toda e qualquer figura que faça referência a tal animal.

Os dois votos vencidos, proferidos pelos ministros Luis Felipe Salomão (relator) e Raul Araújo, trazem uma ótica semelhante, porém, em ônus inverso. O argumento seria de que, ao defender os direitos autorais sobre a charge, o tribunal estaria afirmando que qualquer utilização de um desenho de um leão também estaria sob os direitos autorais do autor, uma vez que, para ambos os ministros, não existe grande diferença entre a charge em questão e qualquer outro desenho do animal. Naquela charge estaria ausente o critério de originalidade (configurador de obra nova).

Como exemplo, se refere aos mascotes de outros clubes que também são representados por um leão, como o Fortaleza e o Avaí, logo, seguindo a lógica do juízo estadual, também estariam submetidos a autorização do chargista, o que não seria admissível, segundo os ministros dissonantes.

3. O USO DE SÍMBOLOS – A ORIGINALIDADE

Contudo, a discussão de originalidade e repetição de símbolos comuns é apenas uma polêmica aparente.

Isto porque, primeiro, se extrai nível de criatividade suficiente para que haja a incidência de direitos autorais sobre a charge como obra nova. Não é, como afirmam os juízes, um mero desenho de qualquer leão, mas uma obra com traços específicos e que, como citado no voto da ministra Maria Isabel Galotti, foi utilizado pelo clube em sua camisa, no lugar do tradicional mascote. Este fato por si só já demonstra que a charge tem em si própria um valor artístico diferente do mascote do clube. Bittar[7] sujeita a proteção das obras autorais à “sua originalidade, apartando-se, assim, de sua regência, as obras puramente técnicas e as despidas de características individualizadoras próprias”.

Por outro lado,a charge também é tratada pelos julgadores como obra derivada, conforme expõe o próprio ministro Luis Felipe Salomão em seu voto, também citando Bittar[8], em termos semelhantes aos seguintes: “Derivadas […] são as obras em que se retoma outra preexistente, em parte ou integralmente, por diferentes processos de elaboração intelectual (transformação, incorporação, complementação, redução, junção, reunião) […] como importam em uso de criação alheia, não prescindem de autorização do autor da obra originária […] pois, em novas elaborações intelectuais sobre criações existentes, sem o concurso direto dos respectivos titulares na sua realização. Geram novas obras que […] ingressam no âmbito do Direito de Autor”.  Isto ocorre pela charge retomar claramente a identidade do Sport Club Recife, com o leão trajando as cores e o brasão original do clube.

4. A INDENIZAÇÃO

Outra questão levantada pelo ministro Luis Felipe Salomão diz respeito aos valores da indenização. Este demonstra que, uma vez que no momento da ação não haviam mais camisas com a obra à venda, a indenização cabível seria, então, a prevista pelo artigo 103 da lei de Direitos Autorais: “não se conhecendo o número de exemplares que constituem a edição fraudulenta, pagará o transgressor o valor de três mil exemplares, além dos apreendidos“. Entretanto, o ministro afirmou a possibilidade de que tal indenização consistisse de enriquecimento sem causa para o chargista Miguel Abreu Falcão, uma vez que sua propriedade, a charge, não passaria de um mero detalhe da vestimenta, e que o principal fator atrativo para a compra de tal não seria seu design, mas o fato de ser um produto do recorrente, estando presente seu brasão. O ministro propôs, por tal motivo, uma redução da indenização para o valor referente a 2% da venda dos 3.000 exemplares dispostos.

Importante induzir que a não aplicação  do referido dispositivo está em harmonia com entendimento jurisprudencial, que reserva o valor de três mil exemplares somente aos casos de edição fraudulenta:

 

DIREITO AUTORAL Pedido de indenização por danos materiais e morais Ação procedente em parte Reprodução indevida de obra científica (curso apostilado de telemarketing) Configuração de dano moral apenas Pedido de aplicação da presunção prevista no parágrafo único, do art. 103, da Lei 9.610/98 (indenização de 3.000 exemplares) Norma especialíssima, reservada apenas aos casos de edição fraudulenta Hipótese diversa da dos autos (reprodução) Aplicação da regra genérica do art. 102 da Lei nº 9.610/98 Quantum fixado em R$ 9.000,00 (100 vezes o maior valor da única obra encontrada) Valor que obedece aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade Sentença mantida. SUCUMBÊNCIA Ônus carreado ao autor, que sucumbiu na maior parte do pedido Sentença mantida. Apelação não provida.

(TJSP;  Apelação 9098507-67.2005.8.26.0000; Relator (a): João Carlos Saletti; Órgão Julgador: 10ª Câmara de Direito Privado; Foro de Santo André – 1ª. Vara Cível; Data do Julgamento: 26/07/2011; Data de Registro: 05/08/2011)

Em seguida, versou sobre como, além desta diminuição referente à indenização por desrespeito aos direitos autorais, também deveria ser revista a indenização por danos morais proposta. Partia da noção de que o chargista estaria não modificando a obra original, mas sim transformando-a, inclusive sem autorização para tal. Deste modo, aplicaria-se que a obra derivada diz respeito somente à direito patrimonial, não cabendo para o chargista nenhum direito moral.

Tal interpretação é claramente danosa e restritiva, pois, conforme aduzido, a transformação cria obra autoral nova. A consideração do ministro, citando os ensinamentos de José de Oliveira Ascensão, indicando que os direitos morais seriam decorrentes somente de modificação, ou seja, prerrogativa particular do autor da obra originária, não levou em conta que esta limitação é só sobre a obra originária e o derivador. Este último, como autor da obra transformada, também é protegido, sob o aspecto moral, naquilo que traz de novo.

5. O USO DA CHARGE E A ANUÊNCIA DO AUTOR

Porém, o aspecto central do julgamento gira em torno da necessidade de autorização autoral em face da charge não configurar hipótese de dispensa da respectiva anuência, por não estar incluída nas disposições dos artigos 46, 47 e 48 da lei 9.610/98.   O ministro Luis Felipe Salomão remete, especialmente, que a charge não constitui hipótese de paródia[9]. Quanto ao instituto, o ministro expôs que: “a expressão paródia abrange, portanto, a caricatura propriamente dita, isto é, o gênero jornalístico opinativo, de intuito cômico/humorístico, que se caracteriza pela representação artística exagerada de traços, detalhes ou defeitos de uma pessoa ou objeto”. O leão da charge, representado com aspecto de força e altivez, não se enquadraria, pois não teria conteúdo cômico/humorístico.

Portanto, sob a ótica do ministro relator e do ministro Raul Araújo, a obra não seria suficientemente original, retrataria objeto deveras abrangente sem elemento criativo, não restaria autorização para se derivar da obra originária,  não seria responsável pelos ganhos obtidos com a venda da camisa do Sport Recife e o autor não poderia ter reconhecida sua paternidade (com o nome do autor vinculado na obra) pela ausência de direitos morais, frente a obra ser derivada.

Os ministros Marco Buzzi, Antonio Carlos Ferreira e Maria Isabel Gallotti divergiram do entendimento vencido exposto. Entenderam que é necessário uma interpretação restritiva da propriedade exclusiva dos clubes sobre suas denominações e símbolos. Assim, não é possível ampliar este domínio sobre charges, animações, caricaturas e outras desenhos que fazem referência aos símbolos de entidade desportiva.

Isto porque, para os ministros, essas obras apresentam caráter originário, já que são revestidas de traços e características próprias. Esta consideração fica clara no voto do ministro Antonio Carlos Ferreira, quando afirma: “O recorrente não é proprietário de todas as imagens que representam o animal eleito para seu mascote – o leão. A titularidade que lhe confere o art. 87 da Lei Pelé não se estende à figura do felino em todas e quaisquer de suas variações […] Logo, a figura elaborada pelo recorrido deve ser qualificada como uma nova produção, nem sequer se enquadrando no conceito de derivação da obra original, porque não resulta de sua transformação”.

Mais importante que isso, considerando a obra como originária se dispensaria a necessidade de autorização expressa, por parte do Sport, para a produção da charge, em contrário, o clube não poderia incluir a charge em suas peças sem a autorização do autor.

Por fim, após a decisão final ser oposta à do relator Luis Felipe Salomão, firmou-se  Marco Buzzi na relatoria do acórdão final, para que fosse caracterizado o caso com a seguinte ementa:

 

RECURSO ESPECIAL – AÇÃO CONDENATÓRIA – DIREITOS AUTORAIS – LEI PELÉ (N. 9.615/98) – PROPRIEDADE EXCLUSIVA DOS SÍMBOLOS DESPORTIVOS QUE NÃO SE ESTENDE ÀS CHARGES E ANIMAÇÕES QUE DIFEREM DA IMAGEM OFICIAL DO CLUBE – NECESSIDADE DE AUTORIZAÇÃO PRÉVIA E EXPRESSA DO AUTOR PARA A UTILIZAÇÃO DA OBRA PROTEGIDA PELA LEI DOS DIREITOS AUTORAIS (N. 9.610/98) – VIOLAÇÃO À REFERIDA NORMA CONSTATADA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM – DEVIDA A INDENIZAÇÃO PELOS DANOS MATERIAIS E MORAIS SUPORTADOS PELO AUTOR. INSURGÊNCIA DO DEMANDADO.
Hipótese: Trata-se de ação condenatória, visando à indenização dos danos patrimoniais e morais decorrentes da utilização por parte dos demandados, sem autorização e tampouco pagamento, de obra/desenho de autoria do demandante, que fora reproduzida nas camisas do time de futebol e comercializadas para o público, porém sem qualquer retribuição financeira pela sua reprodução.
1. O cartunista criador de caricatura – na hipótese, um mascote representativo de entidade desportiva – é titular de direito autoral, nos termos do que dispõe a Lei 9.610/98 – Lei dos Direitos Autorais.
2. A propriedade exclusiva a que se refere o artigo 87 da Lei 9.615/98 – Lei Pelé – não se estende às charges, animações e até mesmo aos desenhos que representam símbolos, mormente quando esses diferem nitidamente da imagem oficial do clube, como no caso dos autos. A interpretação da referida norma deve ser restrita, sob pena de conferir a proteção infinita dos caracteres relacionados ao desporto e ampliar a norma além do que pretendeu o legislador.

3. A Lei dos Direitos Autorais (n. 9.610/98) preceitua que cabe ao autor o direito exclusivo de utilizar, fruir e dispor da obra literária, artística ou científica, dependendo de autorização prévia e expressa do autor sua utilização, por quaisquer modalidades.
4. Na hipótese, o recorrente utilizou a imagem criada pelo autor, sem autorização, infringindo a legislação que protege os direitos autorais, sendo devida a indenização pelos danos materiais e morais decorrentes de tal violação.
5. Recurso especial desprovido.
(REsp 1342266/PE, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Rel. p/ Acórdão Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 07/03/2017, DJe 05/05/2017).

O entendimento que prevaleceu é certamente o que concede maior proteção aos cartunistas e chargistas, principalmente quanto a sua atuação perante o meio jornalístico esportivo, dando preferência ao mandato constitucional do art. 5º, XXVII[10], restringindo a abrangência da propriedade imaterial do clube.

Efetivamente, conforme dispõe o acórdão do TJPE e o próprio julgamento vencedor do litígio em análise, o mérito do processo ir em favor do Sport Clube Recife seria prejudicial a uma prática jornalística e a todo o setor de cartunistas, que poderiam ter sua atividade profissional tornada ilícita.

Caso prevalece-se a observância da propriedade exclusiva do clube de futebol no caso em tela, qualquer charge decorrente deveria: (i) deter conteúdo cômico/humorístico para configurar paródia e, assim, não necessitar de autorização prévia do autor, ou (ii) ter qualquer outro conteúdo; configurando caso excepcional;  não conflituoso com a exploração normal da obra; e desde que não prejudicasse, injustificadamente, os interesses legítimos do titular do direito (regra dos três passos da Convenção de Berna e acordo TRIPS).  Fora essas hipóteses, necessário seria a autorização expressa e recorrente das entidades desportivas para representação de seus símbolos em charges (o que poderia desestimular a própria atividade do cartunista).

Porém, mesmo que decidido que a charge consiste em obra nova, é impossível ignorar que ela tem influência e inspiração nos símbolos representativos dos clubes e, no caso concreto, do clube Sport. Isto é admitido pelos próprios ministros que votaram pela procedência do pedido e pelo autor.

Certamente, ainda que incluída de traços distintivos e características próprias, a charge decorre da imagem do brasão e mascote do Sport Clube Recife. Nos votos favoráveis ao autor, não há qualquer consideração quanto ao grau de influência dos símbolos do clube na obra, sendo contundentes (e relativamente arbitrários) em afirmar de que se trata de obra originária. Esta é a consideração essencial para a decisão de necessidade ou não da permissão do clube de futebol ao autor da obra.

Isto porque, obviamente o brasão, mascote e outros símbolos do clube tiveram um autor, pessoa física, que produziu esses símbolos como criação intelectual. Sendo assim, o discurso de obra derivada, ao qual se comentou anteriormente, aparenta ser o mais adequado, ainda que os ministros favoráveis ao julgamento que prevaleceu não tenham tratado sobre o assunto.

6. A PROTEÇÃO LEGAL: A LEI PELÉ

Por outro lado, percebe-se que a autorização para a transformação da obra originária, segundo o art. 29, III da lei de direitos autorais[11], deve ser fornecida pelo autor desta, o que o Sport Clube Recife não é.

O já excessivamente comentado art. 87 da Lei Pelé, dispõe o clube como proprietário exclusivo da denominação e os símbolos de entidade, não como autor desses. Motivo pelo qual, inclusive, impõe uma proteção legal fortíssima de validade em todo o território nacional, por tempo indeterminado, sem necessidade de registro ou averbação no órgão competente.

Os símbolos da entidade, caso fossem objeto de proteção pela lei de autor, estariam em flagrante desrespeito ao aspecto de interesse público da obra, por serem assegurados por tempo indeterminado. A entidade desportiva seria elevada ao patamar de um “super autor”, cujas obras, que sequer foram produzidas por ela ou decorrentes de sua organização, trabalho diretivo ou cessão inequívoca do autor original, jamais entrariam em domínio público, ferindo o interesse da coletividade pela ofensa ao disposto no  Art. 33, caput da lei 9.610/98[12].

Logo, parece claro que o legislador da lei pelé não visava produzir norma de direito de autor quando redigiu o art. 87, uma vez que a lógica deste artigo estaria em oposição a toda sistemática do direito de autor e seu interesse público.

7. CONCLUSÃO

Conclui-se, portanto, que é dispensável a autorização expressa do clube de futebol para que o cartunista Miguel Abreu Falcão produzisse charge derivada de características do clube, uma vez que, ainda que a entidade seja proprietária de seus símbolos, não se trata de autora ou cessionária dos direitos do autor sobre esses.

Por fim, é acertada a decisão final do STJ, pois deu maior proteção a atividade profissional e artística do cartunista; indicou, ainda que sem fundamentação, que era dispensável a autorização expressa para transformação do símbolo da equipe de futebol, uma vez que não se trata de obra derivada; reconheceu o caráter criativo e, consequentemente, a violação aos direitos autorais deste em frente a não autorização para utilização econômica pelo clube e pela fornecedora de material esportivo à época; assim como demonstrou a violação ao direito moral de autor, pelo não reconhecimento da autoria da obra nas reproduções dessa.

 


[1] Pesquisador Graduação GEDAI/UFPR

[2] Pesquisador Graduação GEDAI/UFPR

[3] Art. 87. A denominação e os símbolos de entidade de administração do desporto ou prática desportiva, bem como o nome ou apelido desportivo do atleta profissional, são de propriedade exclusiva dos mesmos, contando com a proteção legal, válida para todo o território nacional, por tempo indeterminado, sem necessidade de registro ou averbação no órgão competente.

Parágrafo único. A garantia legal outorgada às entidades e aos atletas referidos neste artigo permite-lhes o uso comercial de sua denominação, símbolos, nomes e apelidos.

[4]Art. 24. São direitos morais do autor:I – o de reivindicar, a qualquer tempo, a autoria da obra;II – o de ter seu nome, pseudônimo ou sinal convencional indicado ou anunciado, como sendo o do autor, na utilização de sua obra;

[…].

[5]Art. 29. Depende de autorização prévia e expressa do autor a utilização da obra, por quaisquer modalidades, tais como:I – a reprodução parcial ou integral;

[…].

[6]Art. 33. Ninguém pode reproduzir obra que não pertença ao domínio público, a pretexto de anotá-la, comentá-la ou melhorá-la, sem permissão do autor.Parágrafo único. Os comentários ou anotações poderão ser publicados separadamente.

[7] BITTAR, Carlos Alberto. Direito de Autor. pg. 54  – 6. ed. rev., atual. e ampl. por Eduardo C. B. Bittar. – Rio de Janeiro: Forense, 2015.

[8]  Idem. pg. 49.

[9] Art. 47. São livres as paráfrases e paródias que não forem verdadeiras reproduções da obra originária nem lhe implicarem descrédito.

[10] Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

 

XXVII – aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar;

[11] Art. 29. Depende de autorização prévia e expressa do autor a utilização da obra, por quaisquer modalidades, tais como:[…]III – a adaptação, o arranjo musical e quaisquer outras transformações;

[12] Art. 33. Ninguém pode reproduzir obra que não pertença ao domínio público, a pretexto de anotá-la, comentá-la ou melhorá-la, sem permissão do autor.